Doença atópica: o efeito da intervenção nutricional precoce
Uma intervenção nutricional precoce, durante a gravidez, a lactação e durante o primeiro ano de vida do bebé, pode prevenir ou retardar o desenvolvimento de doença atópica (dermatite atópica, asma e alergia alimentar), em crianças.
Nas últimas décadas a incidência de asma em crianças a partir dos 4 anos aumentou cerca de 160% e a incidência de dermatite atópica triplicou.
Apesar da doença atópica ter uma base genética perfeitamente estudada, os factores ambientais, incluindo a alimentação na infância, podem ter influência importante no seu desenvolvimento.
As seguintes definições são importantes para a compreensão deste texto adaptado de Muraro e colaboradores:
- alergia – reacção de hipersensibilidade iniciada por um mecanismo imunológico.
- atopia – tendência individual ou familiar para produzir anticorpos imunoglobulina E (IgE) como resposta a alergénios, confirmada pelo resultado do teste de picada (exposição) cutânea.
- doença atópica – doença caracterizada por atopia; refere-se tipicamente a dermatite atópica, asma, rinite alérgica e alergia alimentar.
As restrições dietéticas em grávidas e lactantes
A mais antiga possibilidade da influência nutricional na doença atópica é a dieta da mulher grávida, no entanto os estudos não suportam o efeito protetor da exclusão de alimentos alergénios na dieta materna, incluindo a exclusão de leite de vaca e ovos, durante a gravidez.
Apesar de dois estudos demonstrarem que alergénios alimentares podem ser detectados no leite materno (amendoins, leite de vaca e ovos), uma revisão do Cochrane Review também conclui que não há evidência suficiente de que a restrição dietética durante a lactação é benéfica na prevenção de doença atópica em bebés amamentados, com excepção da dermatite atópica em que os estudos existentes não são suficientemente claros na sua metodologia de forma a retirar conclusões precisas.
A importância da amamentação no desenvolvimento da doença atópica
No que diz respeito a crianças com alto risco de desenvolverem atopia, existe evidência que a amamentação exclusiva durante pelo menos quatro meses ou a utilização de fórmulas infantis hidrolisadas (particularmente as fórmulas extensamente hidrolisadas e menos as parcialmente hidrolisadas), reduzem o risco de dermatite atópica quando comparadas com fórmulas infantis standard à base de leite de vaca. No entanto, no que diz respeito a crianças que não tem risco em desenvolver atopia, a amamentação exclusiva durante o período de pelo menos quatro meses não adiciona qualquer benefício na incidência do eczema atópico.
Quanto á ocorrência de asma, apesar de não ser conclusivo que a amamentação exclusiva tem efeito protetor no desenvolvimento de asma em crianças a partir dos 6 anos, a amamentação exclusiva parece reduzir o número de episódios em crianças de idade inferior a 4 anos associados a situações de infeções respiratórias.
Sabe-se que em famílias com histórico de doença atópica, as crianças tem 25% de possibilidade em desenvolver alergia alimentar desde o nascimento até aos 7 anos de idade.
Uma revisão acerca da influência da dieta materna durante a gravidez e a lactação não mostra um contributo significativo no desenvolvimento de alergia alimentar na infância, apesar de vários antigénios alimentares poderem ser encontrados no leite materno. Em teoria, o leite materno deveria inibir a absorção dos antigénios alimentares, no entanto os estudos desenvolvidos nesse sentido não demonstram o efeito protetor do leite materno. Neste momento, baseado em evidências, não podemos afirmar que a amamentação terá um efeito protetor no desenvolvimento da alergia alimentar.
A diversificação alimentar na prevenção de atopia
Em textos anteriores falámos que a diversificação alimentar não deveria ocorrer nunca antes dos 4 meses, nem depois dos 6. Também no que diz respeito ao efeito protetor no desenvolvimento de atopia, não existe evidência de que atrasar a introdução alimentar para além do período dos 6 meses poderá trazer qualquer benefício, independentemente do bebé estar a ser amamentado com leite materno ou através de fórmulas infantis.
A falta de evidência inclui também o atraso na introdução de alimentos considerados mais alergénios, como é o caso do peixe, ovos ou alimentos contendo na base amendoins ou nozes.