O tamoxifeno no cancro da mama hormono-dependente

O tamoxifeno é um modelador seletivo dos recetores de estrogénio que é clinicamente prescrito há mais de 40 anos para o tratamento do cancro da mama hormono-dependente em estadio inicial e avançado. O tamoxifeno pode ser utilizado para tratar o cancro da mama em mulheres em pré e pós-menopausa, motivo que justifica a sua ampla utilização, bem como o cancro da mama em indivíduos do sexo masculino. Este fármaco é também utilizado na prevenção do cancro da mama em casos de elevado risco de desenvolvimento da doença. É uma terapia oral que é normalmente utilizada durante um período de 5 anos.

As características sexuais femininas são asseguradas pelo estrogénio

O estrogénio é uma hormona que é produzida nos ovários e em outros tecidos do corpo humano, como a pele e o tecido adiposo, e cuja função é desenvolver e manter as características sexuais femininas. Sabe-se também que a desregulação hormonal pode promover o crescimento de alguns tipos de cancro, entre os quais o cancro da mama. As células hormonodependentes do cancro da mama possuem recetores específicos para o estrogénio. Após a ligação do estrogénio ao respetivo recetor expresso nas células cancerígenas, o crescimento celular pode ser estimulado.

O tamoxifeno bloqueia o efeito do estrogénio

A terapia hormonal com recurso ao tamoxifeno permite diminuir ou evitar o crescimento de tumores hormonodependentes através do bloqueio dos efeitos do estrogénio. Desta forma, o tamoxifeno é um pró-fármaco que é metabolizado no fígado, pelas enzimas CYP2D6 e CYP3A4, em metabolitos ativos como o afimoxifeno e o endoxifeno, que possuem uma elevada afinidade para o recetor de estrogénio. Por todo o corpo humano, estes metabolitos bloqueiam o efeito do estrogénio pois ligam-se aos recetores de estrogénio, mimetizando a verdadeira hormona e impedindo a ligação desta aos recetores. Como resultado, a expressão génica é modulada, a síntese de ácido desoxirribonucleico (ADN) diminui e os efeitos do estrogénio são inibidos.

Em termos de efeitos secundários, o tamoxifeno induz o aparecimento e o agravamento de sintomas da menopausa uma vez que que suprime a normal função hormonal. Alguns dos possíveis efeitos secundários do tamoxifeno incluem calores e suores noturnos, indigestão ou náuseas, menstruação irregular, perda da densidade óssea em mulheres em pré-menopausa, alterações de humor, depressão, secura vaginal ou irritação e perda da libido. Vale a pena referir, no entanto, que o tamoxifeno induz um efeito cardioprotetor e diminui o risco de angina de peito uma vez que exerce uma ação estrogénica sobre os lípidos plasmáticos.

Alguns fármacos podem interferir com a ação do tamoxifeno, entre os quais alguns antidepressivos comumente prescritos, como a paroxetina, a fluoxetina e a sertralina, uma vez que estes fármacos competem pela enzima CYP2D6, essencial para a metabolização do tamoxifeno. Sabe-se também que algumas variantes da CYP2D6 podem resultar num pior prognóstico. Neste caso, a genotipagem pode prever o sucesso da terapêutica e ditar uma abordagem clínica cada vez mais personalizada.

Referências: Coombes, RC, E Hall, LJ Gibson, R Paridaens, J Jassem, T Delozier, SE Jones, et al. “A Randomized Trial of Exemestane after Two to Three Years of Tamoxifen Therapy in Postmenopausal Women with Primary Breast Cancer.” The New England Journal of Medicine 350, no. 11 (2004): 1081–92.;Fisher, B, JP Costantino, DL Wickerham, CK Redmond, M Kavanah, WM Cronin, V Vogel, et al. “Tamoxifen for Prevention of Breast Cancer: Report of the National Surgical Adjuvant Breast and Bowel Project P-1 Study.” Journal of the National Cancer Institute 97, no. 22 (2005): 1652–62.;Fisher, B, J Dignam, N Wolmark, DL Wickerham, ER Fisher, E Mamounas, R Smith, et al. “Tamoxifen in Treatment of Intraductal Breast Cancer: National Surgical Adjuvant Breast and Bowel Project B-24 Randomized Controlled Trial.” Cancer Radiotherapy 3, no. 6 (1999): 524–25.;Howell, A, J Cuzick, M Baum, A Buzdar, M Dowsett, JF Forbes, G Hoctin-Boes, J Houghton, GY Locker, and JS Tobias. “Results of the ATAC (Arimidex, Tamoxifen, Alone or in Combination) Trial after Completion of 5 Years ’ Adjuvant Treatment for Breast Cancer.” Lancet 365, no. 943 (2005): 60–62.;Jin, Y, Z Desta, V Stearns, B Ward, H Ho, K-H Lee, T Skaar, et al. “CYP2D6 Genotype, Antidepressant Use, and Tamoxifen Metabolism during Adjuvant Breast Cancer Treatment.” Journal of the National Cancer Institute 97, no. 1 (2005): 30–39.;Powles, TJ, S Ashley, A Tidy, IE Smith, and M Dowsett. “Twenty-Year Follow-up of the Royal Marsden Randomized, Double-Blinded Tamoxifen Breast Cancer Prevention Trial.” Journal of the National Cancer Institute 99, no. 4 (2007): 283–90.;www.cancer.gov/types/breast/breast-hormone-therapy-fact-sheetww5.komen.org/BreastCancer/Tamoxifen.html

Ana Catarina Mamede, natural de Peniche, é Doutorada em Biomedicina pela Universidade da Beira Interior. É membro da equipa de investigação da Unidade de Biofísica e do Centro de Investigação em Meio Ambiente, Genética e Oncobiologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. Autora de vários artigos científicos, livros e apresentações. Os seus atuais interesses de investigação são no domínio da comunicação de ciência, particularmente na área da saúde. Fundadora e CEO da Research Trial (www.research-trial.com), uma agência de Comunicação de Ciência. Usa o novo acordo ortográfico. Ana Catarina Mamede, from Peniche, completed the PhD in Biomedicine at the University of Beira Interior. She is member of the research team of the Biophysics Unit and the Center of Investigation in Environment, Genetics and Oncobiology of the Faculty of Medicine of the University of Coimbra. Author of several scientific articles, books and presentations. Her current research interests are in the field of science communication, particularly in health. Founder and CEO of Research Trial (www.research-trial.com), a Science Communication agency.