Dieta e inflamação: influência na mortalidade por cancro
A inflamação é uma resposta do organismo a agressões nos tecidos ou provocada por agentes inflamatórios, podendo ser aguda ou crónica. A primeira representa um importante passo para a recuperação dos tecidos, enquanto a segunda tem sido associada ao risco e à progressão de alguns tipos de cancro.
Inflamação e dieta
A dieta pode ter um papel determinante na inflamação, pela sua importância como fator modelador. Alguns componentes alimentares parecem influenciar a inflamação e a mortalidade em casos de cancro colo-retal, do pâncreas, do esófago, do endométrio, hepatocelular e da próstata, modificando as respostas inflamatórias e os resultados na saúde.
Assim, foi desenvolvido o conceito de Índice Inflamatório da Dieta (DII) para avaliar o potencial de determinados hábitos alimentares em provocar inflamação, variando do máximo anti-inflamatório ao máximo pró-inflamatório.
Num estudo de coorte prospetivo com 12366 participantes, o consumo de uma dieta indutora de inflamação esteve associada ao aumento de risco de mortes por cancro e, especificamente, por cancros digestivos. Verificou-se que aqueles que consumiam uma dieta mais pró-inflamatória eram 46% mais propensos a morrer de cancro, aumentando para 110% no caso especifico dos cancros do trato digestivo.
Componentes da dieta no controlo da inflamação
Existem vários fatores dietéticos que têm diferentes efeitos na inflamação.
Por exemplo, o consumo de carne vermelha parece aumentá-la e os vegetais de folhas verdes parecem reduzi-la. No estudo anteriormente citado, o consumo de carne vermelha não esteve associado a um DII elevado mas sim ao nível mais baixo de potencial inflamatório da dieta. Segundo os autores, esta observação pode ser justificada pelo facto de, os consumidores de carne vermelha incluídos no estudo terem ingerido quantidades suficientes de outros alimentos que contribuíram significamentemente para o efeito anti-inflamatório da dieta.
Os estudos realizados sobre a relação entre alimentação e mortalidade têm mostrado uma associação inversa entre a ingestão de parâmetros alimentares anti-inflamatórios, como o selénio e o magnésio, e a mortalidade. De um modo muito genérico, a alimentação deve apresentar um valor calórico capaz de manter um peso adequado, devendo ser moderada em gordura, baixa em açúcares simples, gorduras trans e saturada e rica em frutas, hortaliças e alimentos integrais. Todavia, é importante ter em conta a influência específica de diferentes elementos dietéticos nos níveis de marcadores inflamatórios (ex: proteína C-reativa, interleucina-6 e fator de necrose tumoral -α).
Um dos possíveis mecanismos para justificar a relação entre uma dieta pró-inflamatória e a mortalidade pode envolver o efeito deste tipo de alimentação na resistência à ação da insulina, por aumento da inflamação sistémica. O consumo de carne vermelha e manteiga, por exemplo, tem mostrado aumentar a inflamação sistémica, por aumento de proteína C-reativa, selectina E e molécula de adesão celular vascular-1, as quais são responsáveis pelo aumento da resistência à insulina. Esta insulino-resistência está associada a cancros digestivos, podendo resultar na progressão da doença e, se não controlados, na morte.
Em conclusão
Os doentes oncológicos que fazem uma alimentação pró-inflamatória parecem ter um risco aumentado de morte, comparativamente aos doentes que optam por uma alimentação anti-inflamatória. Deste modo, parece ser útil introduzir o cálculo do DII como ferramenta de intervenção nutricional na prevenção e tratamento do cancro, com perspetivas de controlo da inflamação.