Diarreia em doentes oncológicos: recomendações alimentares

A ocorrência de diarreia, em doentes oncológicos, é frequente, consistindo num aumento da frequência de defecações e/ou da fluidez das fezes. No cancro, a diarreia pode estar relacionada com várias causas, como ansiedade, alterações da dieta, medicação, infeção, cirurgia, radioterapia, tumor, obstrução e quimioterapia.

Embora a gravidade da diarreia possa variar consideravelmente, esta tem um grande impacto na qualidade de vida. Os doentes, além de terem de lidar com o aumento da frequência dos movimentos intestinais, também podem apresentar dores abdominais, cólicas e alterações da pele na região anal e perianal.

Poderão ainda, ocorrer aversões alimentares ou recusa total da alimentação, devido à antecipação da diarreia subsequente à ingestão alimentar, conduzindo à perda de peso e à malnutrição. Fadiga, perturbações do sono, vontade de isolamento e depressão são consequências comuns àqueles que apresentam diarreia. Todavia, as alterações fisiológicas de episódios severos ou prolongados de diarreia podem resultar em desidratação e desequilíbrio eletrolítico, colocando a vida em risco. Por outro lado, a combinação de diarreia grave com neutropenia é potencialmente perigosa, devido ao risco elevado de sépsis.

Assim, uma intervenção especializada é fundamental. O tratamento da diarreia inclui as componentes farmacológica e a não farmacológica, esta abrangendo a dieta e os probióticos, os quais podem ter um efeito benéfico na prevenção da diarreia provocada pelos tratamentos oncológicos.

Quando o fármaco a ser usado na quimioterapia, associado à dose e à frequência de administração, tem a diarreia como potencial efeito secundário, os doentes devem ser encaminhados para a consulta de Nutrição. O objetivo será a prevenção da degradação do estado nutricional ou então, atingir um estado nutricional adequado. O mesmo deve acontecer a doentes com cancros ginecológicos, urogenitais e retais sujeitos a radioterapia pélvica, nos quais o risco de diarreia é elevado.

Que alimentação, em casos de diarreia?

A intervenção dietética para controlo da sintomatologia em questão vai depender da gravidade da diarreia. No caso de o doente apresentar um aumento de até 6 dejeções/dia, comparativamente ao habitual, sem sinais ou sintomas graves, há alimentos que deve evitar, optando por outros.

Os doentes deverão evitar os seguintes alimentos:

– alimentos que contenham lactose

– suplementos com elevada osmolaridade

– especiarias

– alimentos ricos em fibra insolúvel como os cereais ricos em fibra, brócolos, milho, couves, ervilhas, legumes e frutos crus, entre outros.

– alimentos ricos em gordura

– cafeína (café, chá, colas)

– álcool

– alimentos que provocam flatulência como os bróculos, lombardo, cebola, leguminosas, entre outros.

Diarreia: alimentos preferenciais

Por outro lado, há alimentos que são uma opção adequada. Deve dar-se preferência a alimentos como:

–  caldos claros (frango/galinha, carne de vaca ou vegetais) e tisanas (camomila, cidreira, etc.) para que haja um aporte hídrico na ordem dos 8 a 12 copos de água

– sumo de fruta cozida (por exemplo maçã ou pêra), sumos de cenoura ou banana, águas minerais sódicas pouco gaseificadas

– soros de rehidratação oral

– gelatina

– consumir com frequência pequenas refeições de digestão fácil (bananas, arroz, fruta cozida ou em calda, torradas, massas simples, batatas, carne (galinha, frango, perú) cozida e sem pele, crackers, ovos, noodles)

– sopa preparada apenas com arroz, cenoura e batata

– as bananas, o arroz, a maçã cozida e as torradas de pão branco, são preferenciais, no caso de diarreia severa

Quando o aumento de dejeções é de 4 a 6 por dia, a quimioterapia é, muitas vezes, suspensa e a dose do fármaco considerada. Nestes casos, estas recomendações alimentares devem manter-se até que a diarreia seja ultrapassada. Note que deverão ser registadas o número e o momento de dejeções, para reavaliação clínica.

Perante um aumento de dejeções superior ou igual a 7 por dia ou inferior a 7 mas com cólicas moderadas ou severas, náuseas/vómitos, prejuízo da capacidade física, febre, sépsis, neutropenia, hemorragia ou desidratação, o doente deverá ser admitido no hospital.

Referências: Andreyev J, Ross P, Donnellan C, Lennan E, Leonard P, Waters C, Wedlake L, et al.. Guidance on the management of diarrhoea during cancer chemotherapy. The Lancet. 2014; 15(10): e447–e460; National Cancer Institute (NCI). Managing Chemotherapy Side Effects – Diarrhea. Disponível em: https://www.cancer.gov/publications/patient-education/diarrhea.pdf. Acedido a 22/1/2017; National Health Service (NHS). Clinical Guideline for the Assessment and Management of Chemotherapy Induced Diarrhoea. Disponível em: http://www.rcht.nhs.uk/DocumentsLibrary/RoyalCornwallHospitalsTrust/Clinical/CancerServices/ClinicalGuidelineForTheAssessmentAndManagementOfChemotherapyInducedDiarrhoea.pdf. Acedido a 22/1/2017; Wang Y-H,  Yao N,  Wei K-K,  Jiang L,  Hanif S,  Wang Z-X, Pei C-X. The efficacy and safety of probiotics for prevention of chemoradiotherapy-induced diarrhea in people with abdominal and pelvic cancer: a systematic review and meta-analysis. European Journal of Clinical Nutrition. 2016; 70: 1246-1253. Fontes de imagens: http://www.huffingtonpost.co.uk/2016/05/04/ovarian-cancer-symptoms-causes-and-treatment_n_9354336.html; http://www.centergihealth.com/ulcer-bacteria-linked-to-stomach-cancer.html

Dina Raquel João é Nutricionista e Mestre em Nutrição Clínica, membro efetivo da Ordem dos Nutricionistas (nº 0204N), com o Título de Especialista para a área de Terapia a Reabilitação da Classificação Nacional de Áreas de Educação e Formação, subárea da Nutrição, tendo desenvolvido a sua atividade profissional principalmente na prática clínica, na docência e formação e na investigação. Como Nutricionista, iniciou atividade clínica em 2001, tendo exercido a nível hospitalar, em centro de saúde e em clínica privada. A experiência profissional na área da investigação decorreu, essencialmente, na área oncológica, tendo sido premiada nesse campo (1º Prémio de Nutrição Clínica da Fresenius Kabi, em 2002). Conta com diversas comunicações científicas orais e em painel, tanto em eventos nacionais como internacionais. Atualmente, é Professora Adjunta Convidada na Universidade do Algarve – Escola Superior de Saúde, lecionando à licenciatura em Dietética e Nutrição.