L-carnitina e efeitos adversos da quimioterapia
Até 80% dos doentes com cancro avançado apresentam carência em L-carnitina.
O défice de L-carnitina tem um papel na prevalência de alguns sintomas, como a fadiga e a malnutrição. Uma dieta desequilibrada pode ser uma das causas. Contudo, também a competição com alguns fármacos usados em quimioterapia (ex: antraciclinas competem com a carnitina pelo mesmo transportador) ou a inibição da produção da L-carnitina por antraciclinas podem levar à carência deste micronutriente. Uma outra causa possível é a excreção renal excessiva, para a qual contribuem a cisplatina e a ifosfamida. Estes dois fármacos prejudicam, ainda, o transporte da L-carnitina e a produção de energia pelas células através deste micronutriente, exercendo um efeito tóxico a nível neurológico e cardíaco e aumentando o risco de fadiga.
Embora os resultados dos diferentes estudos não tenham chegado às mesmas conclusões, parece que os suplementos de L-carnitina podem reduzir os efeitos tóxicos cardíacos das antraciclinas e da interleucina-2 usadas no tratamento do cancro. Além disso, parecem reduzir os efeitos neurotóxicos dos taxanos, sem afetar o efeito destes fármacos anticancerígenos.
Um trabalho com doentes oncológicos concluiu que a L-carnitina (1g/dia) pode ser benéfica para prevenir complicações cardíacas, durante o tratamento com interleucina-2. Todavia, noutro estudo com doentes com linfoma não-Hodgkin, os autores não encontraram nenhuma evidência de que a suplementação com o micronutriente (3g antes de cada ciclo de quimioterapia, seguido de 1g/dia durante 21 dias) protegesse da ação cardiotóxica da antraciclina.
Ainda, dois estudos prospetivos com doentes oncológicos com diferentes graus de neuropatia periférica causada pela cisplatina e pelo paclitaxel concluíram que a acetil-L-carnitina pode ser benéfica no tratamento. À mesma conclusão chegaram os autores de um trabalho não publicado com doentes oncológicos tratados com taxol isoladamente e em combinação com fármacos neurotóxicos e não neurotóxicos, referindo mesmo um ação significativa da acetil-L-carnitina. Contudo, estes resultados não são consensuais, dado que outros autores referem que a substância pode ainda aumentar a neuropatia periférica induzida pela cisplatina.
Alguns trabalhos têm mostrado que a administração de L-carnitina em doses de 2-6g/dia pode reduzir a perda de peso e/ou a fadiga experienciadas por doentes oncológicos mas os resultados não são partilhados por todos os estudos. Uma melhoria na condição mental e física dos doentes após a administração de uma alta dose de L-carnitina pode ser atribuída não só à melhoria na produção de energia pela célula mas também a um efeito favorável do micronutriente na utilização da glicose e no metabolismo das citocinas. Mas, quatro ensaios randomizados concluem que a L-carnitina não reduz a fadiga moderada ou severa associadas ao cancro e que a acetil-L-carnitina não previne o aparecimento de fadiga durante a quimioterapia com taxanos.
No que diz respeito à anorexia e à caquexia associadas ao cancro, a L-carnitina parece ter uma ação benéfica. Num trabalho com doentes com cancro do pâncreas em estadios avançados, verificou-se um efeito positivo significativo na qualidade de vida e no estado nutricional em resultado da administração de L-carnitina (2g, 2x/dia). Verificou-se, ainda, uma tendência de aumento da sobrevivência nos doentes aos quais foi administrado o micronutriente, bem como uma redução do tempo de internamento.
O que se recomenda?
A evidência que a L-carnitina possa ter uma influência positiva na anorexia e na caquexia relacionadas com o cancro é ainda fraca. Os suplementos orais e a administração parentérica de L-carnitina pode ajudar os doentes com um estado nutricional deficitário e em regimes de quimioterapia que possam induzir uma carência no micronutriente, como a cisplatina e a ifosfamida. A acetil-L-carnitina ou a L-carnitina podem também ser benéficas na prevenção e no tratamento da neuropatia periférica induzida pela quimioterapia (taxanos).